quarta-feira, 21 de maio de 2008

Nas entrelinhas, o silêncio berra ininteligíveis expressões


O silêncio, inclusive aquele cultuado nas entrelinhas de um diálogo barulhento, é perverso. Perverso porque omite exatamente o que se gostaria de falar e calou. Oculta o que se queria saber e não se perguntou.

Nessa lacuna, nesse inconveniente hiato verbal, resta intacta a inquietante ignorância dos pensamentos alheios, responsável por tantos mal-entendidos, por tantos rompimentos de amores e amizades, por tantos julgamentos errôneos e precipitados.

O ápice da intercomunicação acontece quando conseguimos entender o outro, não por aquilo que ele disse, que ressaltou com tanta veemência, que bradou em voz estridente socando a mesa, mas reside naquilo que se deixou de explicitar, que entre constrangido e hesitante, se furtou falar, naquilo que restou velado, ainda que implicitamente denunciado, em pequenos gestos, em trocas de olhares profundos, em atos à primeira-vista insignificantes para com o outro.


E não seriam as reticências também o silêncio daquilo que mais queríamos dizer, revelar, e por motivos mil omitimos? Por outro lado, o silêncio que reside na omissão, também representado nas reticências, nos abre espaços para múltiplas interpretações. E leitura - aqui entendida como compreensão, não como técnica de decodificação- não é ato isolado, lógico e exato. Ler o outro, as suas palavras, ainda mais, ler os seus silêncios , infelizmente, é assimilação de caráter relativo. Totalmente atado à experiência pessoal, ao contexto de vida de cada um de nós, preso naquilo que cada um de nós acredita ser o certo ou errado.
Além disso, quando lemos o outro, quando buscamos decifrar um ser diferente de nós, existe uma tendência quase automática de, paralelamente, iniciarmos um julgamento de valor daquele ser, que na maioria das vezes nada mais é do que um ilustre desconhecido. Mas nós, seres humanos falhos e limitados, acreditamos que nossa janela para o mundo é a mesma de todos os demais. Que enxergamos tudo da mesma maneira que o outro enxerga. E se o outro se nega a ver o nosso ‘certo’ é porque o outro é que está faticamente errado.

Impossível interpretar o outro, as suas atitudes ímpares, suas gritantes omissões, sem que se utilize dos próprios contextos falhos. Falhos porque individuais, da minha realidade, do meu cotidiano, da minha bagagem cultural. Totalmente desvinculado do contexto de vida alheio, desse outro ser incógnito, que muitas vezes se exibe aos meus olhos enquanto uma imensa ilha, misteriosa e inabitável.

domingo, 18 de maio de 2008

Tempo: O senhor de tudo


Tudo se esvai com o tempo. Voluntária ou involuntariamente. E deve ser assim...
Vai-se o grande amor, aquele que nenhum outro mais substituirá. Vai-se o emprego dos sonhos, e também aquele empreguinho 'furreca' que você optou por perder. Em frações de segundo, por conta da hesitação, da culpa, do medo, perde-se talvez para sempre a oportunidade de ser feliz. Esvai-se...
Gastamos, tantas vezes contra a vontade, horas insubstituíveis da nossa vida no trânsito, no consultório médico, na fila do banco, no supermercado. Horas! Perdidas em vão. Vai-se assim o tempo que poderíamos usufruir com os pequenos prazeres da vida. Esperando, perdemos tantas vezes nosso tempo com o 'nada'.

Todos os dias nós, seres "bitisados" do mundo pós-moderno, consumimos preciosas horas da nossa existência frente ao computador, seja a trabalho ou a lazer. Perdemos, consumimos, gastamos. Seja qual for o termo que se empregue, todos nós, todos os dias, desperdiçamos nosso tempo com deveres nada prazerosos. E esse tempo gasto, desperdiçado, esse consumado tempo, se esvai, se perde para sempre. É uma via de sentido único. E não há como voltar.
Felizmente também gastamos, ou melhor, aproveitamos horas da nossa vida com outros distintos afazeres, verdadeiramente prazerosos: Assistindo um filme maravilhoso e inspirador; Curtindo aquele livro que se esperou com tanta ansiedade para comprar e agora se perde também horas a adiar sua leitura, como se com isso o prazer de lê-lo pudesse ser multiplicado.
Deleitamos-nos a usufruir horas da nossa existência saboreando músicas que animam nossa alma. E, estranhamente, também encontramos prazer ao ouvir melodias que nos trazem piegas lágrimas aos olhos. E quantas horas de toda nossa existência usamos para sonhar com aquele amor que nos tira a razão? Incontáveis...
Sob as bênçãos de Eros, Hipnos e Baco (ou Dionísio, como queiram) gozamos horas de nossa vida com os incomensuráveis prazeres da carne: Horas a fazer amor com o aquele ser único, dono e senhor total de seu tesão; Horas a dormir, quando o corpo cansado outra coisa não pede; Horas a usufruir dos prazeres do vinho e da boa mesa, sempre acompanhado de pessoas queridas. Horas que por si só justificam toda a nossa existência.


Consumido com ou sem prazer, o tempo é e sempre será efêmero. Na ilusão daquilo que parece ser, sem o ser realmente. O tempo, essa invenção humana para aprisionar em suas linhas o próprio homem, em momentos distintos, parece ser uma das mais lindas invenções
humanidade.
Ao observar meus descendestes e vê-los tão díspares de mim, ainda que de mim saídos, penso que esta é mais uma das tantas belas contribuições do tempo: Traçar - nos nossos-, características tão distintas de nós, porquanto atreladas à contemporaneidade de suas vidas. Iguais e tão diferentes. Porque o senhor tempo assim quis e o fez.


Resta-nos aclamar mestre Caetano e sua 'Oração ao tempo':


'És um senhor tão bonito

Quanto a cara do meu filho

Tempo, tempo, tempo'...

domingo, 11 de maio de 2008

Fair Play


Lanie era uma garota ímpar, capaz de fazer qualquer coisa pelo bem e conforto do outro. Batalhadora, dona da própria vida, era bonita e feliz. Extremamente sociável e agregadora. Sempre era ela quem organizava as reuniões dos amigos. E nunca esquecia de dar atenção a ninguém. Os homens se encantam com ela. As mulheres sucumbiam à tamanha empatia que, naturalmente, emanava da moçoila.
Um dia, contrariando até mesmo suas próprias expectativas, Lanie se apaixonou por um rapaz. Ronaldo era exatamente o oposto de Lanie. Quieto, reservado, reacionário e um tanto quanto machista.


Apaixonada, Lanie viu sua independência e auto-suficiência irem por água a baixo. Não conseguia mais ser feliz sem a presença do seu amor. Não conseguia fazer suas festinhas costumeiras sem que Ronaldo estivesse presente.
Ronaldo, por sua vez, desconhecia a palavra tato. Se não gostava de uma amiga ou amigo de Lanie, fazia questão de deixar isso muito claro para todos. Algumas vezes até criava brigas sem sentido no meio das comemorações. E Lanie, cegamente apaixonada, tudo ponderava, sempre relevando os vexames que Ronaldo dava em nome do amor que sentia por ele.
Já o amor que Ronaldo sentia era regido por um signo maior: O ciúme. Tal qual os primitivos machos neanderthais, metaforicamente falando, Ronaldo arrastava Lanie para a caverna sempre que se sentia ameaçado em ter que dividir a atenção de sua amada com outra pessoa. Lanie era sua e de mais ninguém.

E Lanie representava bem o papel de fêmea enamorada, portanto submissa, como fora ensinado às mulheres desde os primórdios. Embora constrangida com os vexames que Ronaldo promovia em público, não conseguia imaginar-se sem o seu amor. Portanto, preveria crer que os rompantes exacerbados do rapaz logo passariam.
Por meses a fio, Lanie viveu unicamente por Ronaldo e para ele. Mudou de cidade, afastou-se de amigos queridos, já que os ciúmes de Ronaldo, e também a distância de sua cidade natal, assim o pediam. E assim Lanie começou a esquecer de si. Vivia a vida de seu amado muito mais que a sua própria. Tudo que ele queria era mais relevante que seus próprios desejos e necessidades.
Lanie não media esforços para deixar Ronaldo contente.
Lanie fez todas as concessões que Ronaldo lhe sugeria, direta ou indiretamente. Mudou hábitos. Afastou-se de amigos. Tudo em prol do amor que nunca antes sentira. E nem foram escolhas tão difíceis assim. Ter Ronaldo naquele momento era o que bastava para ela. Por seu amor, para mantê-lo consigo, Lanie tudo faria (e realmente o fez).

Mas a vida é sarcástica. Tantas concessões foram apagando o brilho de Lanie aos olhos de Ronaldo: Ronaldo não encontrava mais em Lanie a moça independente, sociável e inquieta, que vivia cercada de pessoas, dos tipos mais distintos possíveis, por quem se apaixonara. Lanie agora se mostrava para ele como um ser apático, sem vontade própria. Ronaldo então percebeu seu grande equívoco: Contraditoriamente, combatera e aniquilara na moça exatamente aquilo que despertara nele a paixão arrebatadora por ela. E a paixão fora embora no momento que Lanie, antes altiva e independente, começara a agir como uma súdita que tudo acata e obedece.

E, enquanto Lanie planejava toda uma vida em comum para ambos, Ronaldo só pensava em uma maneira de tornar o fim menos doloroso. Mas a coragem de Ronaldo, bicho-homem viril e volúvel, não o acompanhava quando o assunto era sentimento. E ele adiou o tempo que pode o fim, que em seu ser já restara decidido.
Algum tempo depois, o rapaz, enfadado por não conseguir uma maneira mais nobre para se desvencilhar do compromisso, começou a mudar de comportamento. Tornou-se ranzinza, reclamão, mal-humorado. Talvez uma estratégia inconsciente para que Lanie decidisse por ele dar fim aquele moribundo relacionamento.

Lanie, teimosamente apaixonada, tentava sem sucesso mudar aquela situação. Tentativas vãs: Ronaldo cada dia se fechava mais e mais. Lanie, por não conseguir enxergar as incongruências do seu amado, começou a culpa-se pelo desconforto que sentia na relação. E se culpando, Lanie sem saber, transformava-se mais e mais no ser subserviente e concessivo que exterminara a paixão de Ronaldo.
Um dia Ronaldo, inundado de admirável coragem, de supetão disse a velha e batida frase: 'Não dá mais!'. E pediu para que Laine saísse de seu apartamento. Laine não queria acreditar. Perdeu o chão. Entre lágrimas ponderou, negociou, jurou que mudaria o que estivesse errado caso ele lhe desse uma chance, apenas mais uma.

Contudo a cena, longe de comover ou reativar a paixão adormecida de Ronaldo, irritava-o profundamente, causando-lhe uma vontade urgente de correr, ir para o mais longe possível de Lanie. Na verdade, Ronaldo estava cansado. Cansado do amor incondicional de Lanie, que tudo cedia e nada exigia.

E enquanto Ronaldo fugia súbito e apressado do apartamento, fechando a porta atrás de si, Lanie, num lapso de tempo e sem pestanejar, atirou-se da sacada da sala do apartamento. E ambos fugiram da morte do amor.

quinta-feira, 8 de maio de 2008


Um blog é apenas um blog, apenas um blog...


Naquele tempo chamava-se diário. Um caderninho que toda adolescente tinha. Lá a gente escrevia todos os pequenos segredos inconfessáveis aos pais. O primeiro amor, o primeiro encontro, o primeiro beijo, a primeira mão boba e suas inconfessáveis sensações, misto de medo e vontade urgente.
Lá também, naquele caderninho que ficava tão bem escondido embaixo do colchão (o único lugar que a xereta da sua mãe não o encontraria), eram registradas as grandes desilusões que permeiam a vida de qualquer garota: A decepção causada pela melhor amiga, aquela para quem você daria até o seu melhor jeans, e que se mostrou uma tremenda 'fura-olho'; A briga com seus pais e a vontade de ir embora, por os pés na estrada e descobrir o mundo; O medo de se tornar apenas mais um arremedo de mulher, submissa, casta e triste, como pareciam ser tantas outras mais que você conhecia; Também era lá que ficavam registrados todos os mutáveis sonhos juvenis, fruto de uma mente que sequer teve tempo de aprender a trilhar o próprio caminho; As decepções na escola; O amor que se perdeu por questões insignificantes...
Naquele tempo ter um diário era possuir uma Caixa de Pandora da qual só você tinha a senha para desvendá-la. O diário de uma adolescente era algo ultra-secreto, que você defenderia a intocabilidade com a própria vida. Sim, porque toda adolescente, de todos os tempos (idos e vindos) é intensa até às pontas das unhas. Para elas, tudo se resume a trágica questão de vida ou morte. Meninas não titubeiam em fazer até mesmo greve de fome, e chegam a definhar, ao saberem terem sidos violados os seus segredos (conheço uma doce menina que fez isso).

Mas enfim, éramos tão mais felizes ao resguardar da curiosidade alheia nossas pequenas e insignificantes inconfidências juvenis...


O diário, da forma que a nossa geração conheceu, perdeu-se no tempo. Cedeu seu espaço aos blogs. Curiosamente, não são os adolescentes que os maiores clientes de mais essa ferramenta virtual. Somos nós, a trintona geração coca-cola (ou seria agora geração coca light?).

A meninada não parece ter tanto entusiasmo assim para escrever nessa geringonça virtual. Poucos se arremessam nesse rapel 'Aureliano', aventura mais radical impossível. E se o fazem, utilizam o bizarro e, por vezes, excludente código teen da net, vulgo '
internetês'. E nós, seres primitivos dos anos 80, adoradores da infalível caneta BIC e das cadernetas Faber Castell , gastamos horas à tentar adivinhar o que significa 'OMG', código comumente escrito no diário virtual daquelas estranhas criaturas espinhentas.


Mas, enfim, continuando.

A idéia de construir mais um blog (já tive outros mais que foram, vergonhosamente, abandonados, esquecidos no meio do caminho) atraiu-me inicialmente. Em contrapartida, também gerou em mim um pouco de hesitação. Afinal, minhas idéias nunca foram as mais palatáveis e sociáveis possíveis. Estaria eu contribuindo para aumentar minha legião de desafetos, expondo particularidade de uma
'mente geniosa'(para quem não percebeu, isso é uma ironia)em um instrumento democrático, porquanto sua possibilidade de discondância, como é o blog? É um ponto.


Para além disso, ainda existem outros pontos mais inconvenientes :


Eu, tal como meu amigo designer gráfico (desculpa ai amigo![:d]) e jornalista/escritor desde o nascimento* - Denuxo Caxumba-, sinto-me irritada "com a natureza mono lógica dos blogs".

Sabe aquela sensação péssima que te assola à boca do estômago quando tu lês algo escrito por alguém queridíssimo, algo que tu não concordas, que até mesmo te irrita profundamente, porém, não te sentes confortável para escrever o próprio ponto-de-vista? E quando resolves escrever, se resolves, estais sempre acompanhado do senhor 'ponderação' e da dona 'omissão', que te limam e te calam sempre que tentas ser mais incisivo? 'Pois intão', como diria o Ivanzitos. Isso tudo torna os blogs alheios similares às aulas de professor autoritário. Aquele mestre que não te deixa interromper sua explanação, nem mesmo para esclarecer uma importante dúvida sua, e só te concede o poder da palavra se esta for para reafirmar a incontestável sapiência do todo poderoso.

Há também outro ponto que me incomoda um pouco mais: Não seria o blog pessoal, mais uma entre tantas tentativas dessa nossa triste geração midiática de conseguir seus quinze minutos de fama? Afinal, todos queremos ser ouvidos, lidos e reconhecidos em nossas qualidades. Ou não? Dúvidas, dúvidas e mais dúvidas, como diria aquele meu outro amiguinho...

Apesar de todos esses potenciais empecilhos psicológicos, resolvi construir minha página de vomitação de asneiras verbais. Como tudo mais na vida, esta não é para ser levada sempre à sério. Há que se manter o espaço para o sarcasmo, as piadinhas de duplo sentido, a ironia, e a inexperiência em se tratando de determinados assuntos. Erro que assola 10 entre 10
palpiteiros de plantão. E eu não poderia passar incólume a mais esse pecado.

Meu diário de capa cor de rosa, agora neste blog se vê ressuscitado, com letrinhas mais coloridas e sem a necessidade de usar cola Polar para enfeitá-lo com ridículas, mas imprescindíveis florzinhas e dezenas de coraçõeszinhos. Não é mais um espaço para inconfidências inconfessáveis. É apenas uma ferramenta de leiga palpitação que desejo dividir com os amigos que fiz pela vida afora, no mundo real e também no mundo virtual.

Não esperem demais desse papagaio que existe apenas como possibilidade, explicitação de meu complexo interior de balzaca com eterna alma de adolescente revolucionária. Não esperem nada além de um brinquedinho virtual escrito por alguém falível e irremediavelmente humano (Valha-me Santo Nietzsche!). Portanto, repleto de equívocos e certezas vãs.

Meça-o com olhos de crítico voraz, se assim lhe aprouver. Ou com a assertividade daqueles que preferem o carinho, à retórica maniqueísta. Mas leia-o, acima de tudo, como se fosse um fórum de discussão, tal qual os que freqüentamos nos sites de relacionamentos.
Quero saber sua opinião, seu ponto-de-vista, ter seu feedback. Não é isso que nos distingue dos primitivos? O diálogo? Perceba que o título desse treco não foi escolhido aleatoriamente: Miragens Teylúricas. Nada aqui será mais que isso: Uma sombra vista pelos olhos míopes da autora, de dentro da sua caverna ilusionista. Fantasmas. Miragens. E não haveria de ser diferente, afinal esse troço não pretensiona ser nada além de apenas um blog, apenas um blog...





Em tempo: 'OMG' no código teen da net significa "Oh My God!"[:o].
Valha-me Nossa Senhora das Assimilações Ortográficas![:d]

* Denuxo, para às favas com a obrigatoriedade da titulação, não compactuo com mais essa farsa capitalista, forma contemporânea de exclusão, forjada pela elite e jamais contestada pela intelectualidade permissiva. Forma impositiva que aparta aqueles que possuem dons naturais, primando pelos profissionais direcionados, catequizados e condicionados nas salas acadêmicas.
E tenho dito!(falei bonito, heim!) kkkkkkk