segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Inacabadas

Houve tempo em que eu tinha centenas de cartas. Eu sempre adorei escrevê-las.Brigava com minha mãe, escrevia uma carta longuíssima para ela sobre minha insatisfação e tudo mais. Ficava decepcionada com uma amiga, novamente a caneta e o papel tornavam-se meus confidentes.

Escrevi muitas cartas. Mais do que posso lembrar. A maioria para uma única pessoa. Todas escritas sem a mínima intenção de enviá-las. Era um tipo de catarse. Algumas vezes comprava presentes também. Coisas como um livro, um cd, um bonequinho com a carinha do Chico Buarque. Presentes para alguém que morava distante. E também nunca os enviei.

Todavia as cartas eram o problema. Isso porque eu sempre voltava a relê-las. E quando isto acontecia eu sentia todas as decepções, todas as tristezas, todos os sonhos interrompidos assaltarem-me com uma força grotesca e lacerante. Tudo novamente ali, naquelas palavras. Havia mais dor nisso do que se possa pensar.

Como se eu guardasse todos os sentimentos em papel e tinta. Os sentimentos, que ali grudavam, hibernavam por um tempo a espera de sua dona. E ela sempre voltava para ressenti-los. Tantas vezes quantas possíveis...

Um dia percebi que essa catarse que inventei, não era catarse, era memória perene. Pura, bruta e imutável, porque gravada, selada e jamais enviada. Nesse dia queimei todas as cartas. Abri todos os presentes e os roubei para mim. Mas ainda hoje a memória, essa amiga da lucidez,, ainda me prega peças; tantas vezes faz-me reler todas aquelas idiotas cartas que não mais existem, como um scanner infalível que não se pode destruir, que não se pode queimar, porque não físico.

Em minhas lembranças, leio letra por letra, ponto por ponto tudo aquilo que escrevi no passado - e que as chamas deveriam ter extinguido para sempre. Revivo, relembro, re-sinto lágrima por lágrima tudo aquilo que há tanto ocorreu, do que deveria ter passado, e também daquilo que jamais ocorreu. Do que ficou impresso unicamente em um desejo insatisfeito e nas palavras.

Se a finalidade de uma carta é chegar a seu destino, a seu destinatário, as minhas, estas piégas, cafonas e sentimentalóides cartas, todas ficaram inacabadas. Como inacabada hoje eu me sinto - e sou.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Post-it



(Recado deixado por mim no blog do meu amigo Denuxo e que eu percebi gritar verdades minhas que por muito tempo mal pude ouvir).

Eu que 'grito' diuturnamente, aqui dentro tô mais para 'A Solitária', que afinal, se não catártica, ao menos poética. Pesquei em teu texto algumas mensagens criptografadas (espero decodificá-las -se não em seu todo, ao menos em parte)e em ocasião futura 'regurgitar' sobre elas. Contudo não me furto a dizer que, se somos apenas mais um coadjuvante na imensa multidão que compõe nossa própria história, que ao menos possamos (descumprindo às ordens do diretor desse filme trash) olhar para a câmera e dar um risinho de soslaio quando esta, incidentalmente, nos focar.

A vida é um drama shakespeareano inacabado. Perdemos tempo tentando dar o melhor de nós, o mais ético, o mais moralmente aceitável, a fim de criar um enredo que sirva de molde às próximas gerações, enquanto a platéia se dispersa, boceja e urge pelo fim do espetáculo. Não há fórmulas, esquemas, macetes. Nem há 'o melhor'. Há diferentes cenários, atores distintos, mas o enredo, com raras exceções, quase sempre se repete. Queremos crer que construímos nossa história, Contudo, tantas vezes somos desconstruídos por ela, senão tragados.

Se nossa história de vida se assemelha a mais uma refilmagem barata de um clássico 'Cukorniano', que ao menos sejamos maximamente intensos, inclusive nas dores. Farte-mo-nos de vida. Afinal, nada mais sub-humano que a superficialidade...

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Eu tenho um sonho...


Tempos surpreendentes estes que vivemos. Tempos de esperanças e de sonhos.
Xenofóbica, eu sempre fiz questão de manter certo distanciamento da cultura yankee.
É bem verdade que nem por isso deixei de consumir a viciante coca-cola. Muito menos consegui ignorar Pink Floyd. Tudo o mais daquele povo me foi indiferente.
Influenciada por pessoas queridas, deixei por muito tempo a indiferença privar-me das coisas boas que as infinitas possibilidades da multiculturalidade pode nos trazer (e traz!).
Estava ali pelos 28, 29 anos quando resolvi que me permitira descobrir aquilo que meu coração, naturalmente, já haviam optado por seguir...
E foi assim que me deixei guiar pelo Jazz, pelo Blues, pelo Soul, pelas películas hollywoodianas(até então só conseguia assistir os medíocres filmes nacionais, o cinema francês e algumas películas latinas, como os filmes de Almodóvar)).
Foi o começo da degradação cultural dessa blogueira que vos escreve – como se o brega paraense, por si só, já não fizesse esse trabalho com honorável louvor...
Devo confessar que, estupefacta, hoje flagro-me torcendo pela vitória de um candidato a presidente dos EUA com fervor só comparável a minha antiga e caótica militância Lulista(sim, porque minha militância sempre foi mais pelo metalúrgico que pelo partido em si).
Barack Hussein Obama, filho de uma professora americana do Kansas, de classe média alta, e de um Africano do Quênia, fumou maconha e usou cocaína na juventude enquanto estudava direito em Havard, detalhes contados em sua biografia. Desde ontem, 05 de novembro de 2008, entra para história como o primeiro presidente negro dos Estados Unidos da América.
Contudo, Obama nega esse rótulo. E seu eleitorado, a maioria jovens ansiosos por mudanças drásticas nos arcaicos paradigmas americanos, também.
Obama quer ser lembrado como o político que conseguiu transcender a questão racial na América do Norte, essa potência capitalista que, antagonicamente, por anos a fio conjugou de maneira inversa desenvolvimento econômico versus vanguarda cultural. Senão, como explicar que o racismo ainda seja algo tão comum entre pessoas que dispõem de um aparato tecnológico, informacional e intelectual tão abastado e intenso?.
E assim, entre lágrimas de emoção de um povo que vive o pior momento econômico dos últimos noventa anos, e a decepção daqueles que acreditavam que o partido Republicanos poderia manter-se ad eternum no poder, mesmo com todo caos em que se encontram, produto de uma famigerada especulação econômica no setor imobiliário. O governo Bush, além de entrar para a história como o Presidente norte-americano mais non sense de toda a clã dos ex-residentes da Casa Branca, também pode se orgulhar de mais esse feito: Contribuiu incontestavelemnte para a derrota do seu candidato de partido. Bush foi um dos, senão o maior cabo eleitoral de Barack
Ok, é verdade. Não estou entre os otimistas que acreditam que Obama fará jus à raça, às injustiças sociais e afins.
Não vejo em Obama um justiceiro à altura dos sonhos e das lutas de Luther King. Ao Contrário: Barack não sentiu na pele as agruras de ser um negro morador de guetos discriminado pelo cor e pela classe social. Barack não sabe o que é ser um imigrante ilegal em um dos países que mais rejeita as diferenças.
Talvez por isso, para mim, seja difícil imaginá-lo curando feridas das dores que não sente, que jamais sentiu...
Mas Barack, se não é o sonho ideológico de uma raça subjugada, ao menos representa a mudança possível. O sopro de novos tempos. Tempos em que a todos é permitido sonhar, independente de raça, etnia ou religião.
Impossível negar: a vitória de Obama emocionou-me ao ponto de fazer-me chorar. E(pasmem, caros amiguinhos!) pela primeira vez peguei-me desejando estar equivocada.
Seria Barack Hussein Obama o super-homem que mudará, "como um Deus, o curso da história"?
Quem viver verá!

sábado, 23 de agosto de 2008


Existe um momento em que todos te vêem como alguém que não pode mais fazer bobagens, dizer besteiras, cometer atos fora dos padrões.

É aquele momento em que você já não pode mais ser uma menina inconseqüente e "chutar o pau da barraca".

A maioria de nós sequer percebe quando esse momento chega. A gente fica ali, vendo o tempo passar, tudo se modificando ao nosso redor: casas, ruas, pessoas, situações...

Tudo em constante mutação, mas a gente, obtusamente, não consegue ver a própria mudança no espelho.

Na verdade, ironicamente, continuamos contemplando em nosso reflexo, a mesma menina crédula e romântica que um dia foi.

Mas as pessoas não mais te enxergam assim... As pessoas não mais toleram de você atitudes distintas dos atos frios e práticos, comuns para as decisões do dia-a-dia, Ninguém tolera mais "sentimentalismo barato" vindo de você.

Todos exigem, unicamente, que vocâ seja uma mulher que pensa sempre muito mais que sente.
E você, por não corresponder às expectativas alheias, sente-se uma alienígena que não se encaixar no protótipo que condiz com a sua idade e condição social.

Deveria existir um ritual de passagem para tal situação. Talvez assim tudo ficasse mais fácil...

Há alguns dias fiz 37 anos (caraca, nunca pensei que escreveria minha idade de forma tão descolada assim). 37 com cara de 27, diga-se de passagem(hahahaha).
Há muito não sou mais uma garotinha. Não posso mais recorrer ao colo da mamãe quando qualquer "coisinha" dá errado.
Com 37 anos, eu deveria ser uma mulher forte, decidida, que não hesitase em correr atrás dos próprios desejos, ou mudá-los quando a vida dissesse "não" para os sonhos antigos.

A maioria de nós crê que uma mulher balzaquiana nunca deveria ter medo do escuro quando, no meio da noite, falta energia. Mas quando isso acontece, tantas vezes, me pego gritando no breu da noite.

Eu, mulher de trinta, deveria saber sempre que rumo escolher, que caminho tomar, que porto atracar.

Mas a verdade é que aqui dentro, no mais recôndido âmago do meu ser, ainda sou uma garotinha confusa e amedrontada. Uma mulher que ainda não aprendeu como lidar com o complexo e dúbio mundo adulto.

Mulher que, tal qual uma menina, se deixa escolher pelo "Porto', porque aquele outro, o porto que ela realmente queria, aquele em que ela por anos a fio desejou atracar, fincar suas âncoras, negou-lhe seu mar.

Essa balzaca-menina tem muito medo, e tantas dúvidas, e chora sozinha tantas vezes sem nem mesmo saber o porquê.

E além de toda essa piégas demonstração de fraqueza, essa mulher-menina, ainda sonha muito com as mesmas coisas que sonhava quando menina.

E ainda almeja os mesmos desejos, ainda que agora sem tanta esperança, mas com a mesma inocente fé da menina crédula que um dia foi, embalada pelas mesmas músicas que um dia fizeram-lhe crer que tudo daria certo.

Talvez tudo já tenha dado certo mesmo, ainda que por uma via diferente. E só eu, mulher-menina boba, com constante vendas nos olhos, não tenha percebido.

É! Pode ser...

terça-feira, 1 de julho de 2008

segunda-feira, 30 de junho de 2008


A Teoria da Janelas quebradas diz que nos locais onde se permite pequenas delinqüências, ou se impera a aparência de abandono e do descaso, logo as grandes catástrofes se edificarão.
Tal teoria foi desenvolvida nos Estados Unidos e testada em Nova York. Ao que parece teve êxito, ainda que por um curto espaço de tempo.
Mas enfim, toquei nesse assunto para dizer que quando soube da política do Senador Crivella no Rio, justificado sobre a égide da PAC, logo pensei estar ele sob influência dessa teoria.
Ou seja, consertar fachadas de casas, ruas esburacadas e afins, se encaixa perfeitamente na política de prevenção intrínseca àquela teoria.
Pessoalmente não vejo com olhos de simpatia tal teoria. Parece-me frágil demais tal acepção. E falha. E determinista. Porque não considera uma série de outros fatores, causas reais de atos ilícitos, além da boa ou má aparência dos bairros, guetos, comunidades.
Isso sem mencionar o fato que, nas culturas em que as catástrofes maiores já estão há muito instaladas, preocupar-se em corrigir erros menores a mim soa tal qual a Lei Seca implantada recentemente no Brasil: Paliativo. Mais um desnecessário incentivo à política de encarceramento que vigora no país e que ignora a falta de infra-estrutura, o despreparo, a ineficiência e a incapacidade de uma Estado totalmente punitivo, porém extremamente ausente dos problemas cotidianos de seus cidadãos.
Voltando ao tema, Crivella viu seu devaneio politiqueiro ser abafado pela ação dos 11 militares que atuaram na operação que resultou na morte de três moradores do Morro da Providência, no Rio de Janeiro. Precipitação, despreparo e falta de bom senso: A tríade responsável por um ato que, se não é novidade para a maioria de nós, seres um tanto mais informado (graças a Tupã), ao ser noticiado em rede nacional reflete o verdadeiro absurdo que acontece, comumente, nos subterrâneos do poder estatal.
"Pois então", como diria um povo amigo, nesse momento da vida real, onde todos nós nos sentimos agredidos na nossa dignidade de cidadão, de ser humano, com deveres, mas sobretudo com direitos, talvez alguém, lá no seu âmago mais recôndito tenha, ainda que involuntariamente, feito sua mea culpa por aplaudir a mesma atitude na ficção: Alguns meses assisti, confesso que chocada, as pessoas elogiarem a atuação da força policial no filme "TROPA DE ELITE". A maioria defendia o abuso de poder, por parte dos protagonistas, que usavam e abusavam dos métodos de torturas, tudo em nome da lei, é claro. Ouvi de um amigo essa frase(que gerou uma discussão entre nós): É o Rio de Janeiro. Lá é estado de guerra praticamente. Não há outra atitude a ser tomada.
Continuando. O filme desde as primeiras cenas me incomodou: "que porra de mocinho é esse que ignora as necessidade da sua própria mulher, grávida, e que vive única e exclusivamente em nome de uma instituição que parece ter estagnado na década de 60?
Contudo o povo gostou, aplaudiu, como papagaio repetiu que "bandido bom, é bandido morto".
A tragédia que aconteceu com os rapazes do Morro da Providência talvez ressoe na mente desse povo que pensa que polícia nunca erra. Quiçá lhes conceda a oportunidade de repensar até que ponto devem chancelar, aprovar todos os atos daqueles que representam o Estado e, em seu nome, agem para o bem ou para o mal.
Em todas as mazelas que passamos, sempre há algo a aprender. Que não deixemos mais essa oportunidade nos escapar.

quarta-feira, 25 de junho de 2008


Existe um assustador abismo entre aquilo que você quer dizer, e o que realmente diz. Aprendemos isso desde crianças.

Ainda que, em determinada época da vida, nos revoltemos contra esse condicionamento da vida social, mais cedo ou mais tarde seremos 'calados' por ele.

Há apenas duas saídas para esse paradoxo:
"Floreiar" o que se quer dizer, para que as palavras fiquem mais amenas e suas acepções mais degustáveis, ou calar literalmente sobre aquilo que se pensa. No momento opto pela segunda vereda.






DILEMA DA VIDA REAL:

O mesmo opressor que cerceia teu "discurso" futuramente te cobrará novas palavras.
Vai entender!!!
hahahaha

Ainda que não percebamos, discursamos a vida toda. Até mesmo quando nos posicionamos contra os discursos.
E, sim! Isto aqui é mais um discurso.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Nas entrelinhas, o silêncio berra ininteligíveis expressões


O silêncio, inclusive aquele cultuado nas entrelinhas de um diálogo barulhento, é perverso. Perverso porque omite exatamente o que se gostaria de falar e calou. Oculta o que se queria saber e não se perguntou.

Nessa lacuna, nesse inconveniente hiato verbal, resta intacta a inquietante ignorância dos pensamentos alheios, responsável por tantos mal-entendidos, por tantos rompimentos de amores e amizades, por tantos julgamentos errôneos e precipitados.

O ápice da intercomunicação acontece quando conseguimos entender o outro, não por aquilo que ele disse, que ressaltou com tanta veemência, que bradou em voz estridente socando a mesa, mas reside naquilo que se deixou de explicitar, que entre constrangido e hesitante, se furtou falar, naquilo que restou velado, ainda que implicitamente denunciado, em pequenos gestos, em trocas de olhares profundos, em atos à primeira-vista insignificantes para com o outro.


E não seriam as reticências também o silêncio daquilo que mais queríamos dizer, revelar, e por motivos mil omitimos? Por outro lado, o silêncio que reside na omissão, também representado nas reticências, nos abre espaços para múltiplas interpretações. E leitura - aqui entendida como compreensão, não como técnica de decodificação- não é ato isolado, lógico e exato. Ler o outro, as suas palavras, ainda mais, ler os seus silêncios , infelizmente, é assimilação de caráter relativo. Totalmente atado à experiência pessoal, ao contexto de vida de cada um de nós, preso naquilo que cada um de nós acredita ser o certo ou errado.
Além disso, quando lemos o outro, quando buscamos decifrar um ser diferente de nós, existe uma tendência quase automática de, paralelamente, iniciarmos um julgamento de valor daquele ser, que na maioria das vezes nada mais é do que um ilustre desconhecido. Mas nós, seres humanos falhos e limitados, acreditamos que nossa janela para o mundo é a mesma de todos os demais. Que enxergamos tudo da mesma maneira que o outro enxerga. E se o outro se nega a ver o nosso ‘certo’ é porque o outro é que está faticamente errado.

Impossível interpretar o outro, as suas atitudes ímpares, suas gritantes omissões, sem que se utilize dos próprios contextos falhos. Falhos porque individuais, da minha realidade, do meu cotidiano, da minha bagagem cultural. Totalmente desvinculado do contexto de vida alheio, desse outro ser incógnito, que muitas vezes se exibe aos meus olhos enquanto uma imensa ilha, misteriosa e inabitável.

domingo, 18 de maio de 2008

Tempo: O senhor de tudo


Tudo se esvai com o tempo. Voluntária ou involuntariamente. E deve ser assim...
Vai-se o grande amor, aquele que nenhum outro mais substituirá. Vai-se o emprego dos sonhos, e também aquele empreguinho 'furreca' que você optou por perder. Em frações de segundo, por conta da hesitação, da culpa, do medo, perde-se talvez para sempre a oportunidade de ser feliz. Esvai-se...
Gastamos, tantas vezes contra a vontade, horas insubstituíveis da nossa vida no trânsito, no consultório médico, na fila do banco, no supermercado. Horas! Perdidas em vão. Vai-se assim o tempo que poderíamos usufruir com os pequenos prazeres da vida. Esperando, perdemos tantas vezes nosso tempo com o 'nada'.

Todos os dias nós, seres "bitisados" do mundo pós-moderno, consumimos preciosas horas da nossa existência frente ao computador, seja a trabalho ou a lazer. Perdemos, consumimos, gastamos. Seja qual for o termo que se empregue, todos nós, todos os dias, desperdiçamos nosso tempo com deveres nada prazerosos. E esse tempo gasto, desperdiçado, esse consumado tempo, se esvai, se perde para sempre. É uma via de sentido único. E não há como voltar.
Felizmente também gastamos, ou melhor, aproveitamos horas da nossa vida com outros distintos afazeres, verdadeiramente prazerosos: Assistindo um filme maravilhoso e inspirador; Curtindo aquele livro que se esperou com tanta ansiedade para comprar e agora se perde também horas a adiar sua leitura, como se com isso o prazer de lê-lo pudesse ser multiplicado.
Deleitamos-nos a usufruir horas da nossa existência saboreando músicas que animam nossa alma. E, estranhamente, também encontramos prazer ao ouvir melodias que nos trazem piegas lágrimas aos olhos. E quantas horas de toda nossa existência usamos para sonhar com aquele amor que nos tira a razão? Incontáveis...
Sob as bênçãos de Eros, Hipnos e Baco (ou Dionísio, como queiram) gozamos horas de nossa vida com os incomensuráveis prazeres da carne: Horas a fazer amor com o aquele ser único, dono e senhor total de seu tesão; Horas a dormir, quando o corpo cansado outra coisa não pede; Horas a usufruir dos prazeres do vinho e da boa mesa, sempre acompanhado de pessoas queridas. Horas que por si só justificam toda a nossa existência.


Consumido com ou sem prazer, o tempo é e sempre será efêmero. Na ilusão daquilo que parece ser, sem o ser realmente. O tempo, essa invenção humana para aprisionar em suas linhas o próprio homem, em momentos distintos, parece ser uma das mais lindas invenções
humanidade.
Ao observar meus descendestes e vê-los tão díspares de mim, ainda que de mim saídos, penso que esta é mais uma das tantas belas contribuições do tempo: Traçar - nos nossos-, características tão distintas de nós, porquanto atreladas à contemporaneidade de suas vidas. Iguais e tão diferentes. Porque o senhor tempo assim quis e o fez.


Resta-nos aclamar mestre Caetano e sua 'Oração ao tempo':


'És um senhor tão bonito

Quanto a cara do meu filho

Tempo, tempo, tempo'...

domingo, 11 de maio de 2008

Fair Play


Lanie era uma garota ímpar, capaz de fazer qualquer coisa pelo bem e conforto do outro. Batalhadora, dona da própria vida, era bonita e feliz. Extremamente sociável e agregadora. Sempre era ela quem organizava as reuniões dos amigos. E nunca esquecia de dar atenção a ninguém. Os homens se encantam com ela. As mulheres sucumbiam à tamanha empatia que, naturalmente, emanava da moçoila.
Um dia, contrariando até mesmo suas próprias expectativas, Lanie se apaixonou por um rapaz. Ronaldo era exatamente o oposto de Lanie. Quieto, reservado, reacionário e um tanto quanto machista.


Apaixonada, Lanie viu sua independência e auto-suficiência irem por água a baixo. Não conseguia mais ser feliz sem a presença do seu amor. Não conseguia fazer suas festinhas costumeiras sem que Ronaldo estivesse presente.
Ronaldo, por sua vez, desconhecia a palavra tato. Se não gostava de uma amiga ou amigo de Lanie, fazia questão de deixar isso muito claro para todos. Algumas vezes até criava brigas sem sentido no meio das comemorações. E Lanie, cegamente apaixonada, tudo ponderava, sempre relevando os vexames que Ronaldo dava em nome do amor que sentia por ele.
Já o amor que Ronaldo sentia era regido por um signo maior: O ciúme. Tal qual os primitivos machos neanderthais, metaforicamente falando, Ronaldo arrastava Lanie para a caverna sempre que se sentia ameaçado em ter que dividir a atenção de sua amada com outra pessoa. Lanie era sua e de mais ninguém.

E Lanie representava bem o papel de fêmea enamorada, portanto submissa, como fora ensinado às mulheres desde os primórdios. Embora constrangida com os vexames que Ronaldo promovia em público, não conseguia imaginar-se sem o seu amor. Portanto, preveria crer que os rompantes exacerbados do rapaz logo passariam.
Por meses a fio, Lanie viveu unicamente por Ronaldo e para ele. Mudou de cidade, afastou-se de amigos queridos, já que os ciúmes de Ronaldo, e também a distância de sua cidade natal, assim o pediam. E assim Lanie começou a esquecer de si. Vivia a vida de seu amado muito mais que a sua própria. Tudo que ele queria era mais relevante que seus próprios desejos e necessidades.
Lanie não media esforços para deixar Ronaldo contente.
Lanie fez todas as concessões que Ronaldo lhe sugeria, direta ou indiretamente. Mudou hábitos. Afastou-se de amigos. Tudo em prol do amor que nunca antes sentira. E nem foram escolhas tão difíceis assim. Ter Ronaldo naquele momento era o que bastava para ela. Por seu amor, para mantê-lo consigo, Lanie tudo faria (e realmente o fez).

Mas a vida é sarcástica. Tantas concessões foram apagando o brilho de Lanie aos olhos de Ronaldo: Ronaldo não encontrava mais em Lanie a moça independente, sociável e inquieta, que vivia cercada de pessoas, dos tipos mais distintos possíveis, por quem se apaixonara. Lanie agora se mostrava para ele como um ser apático, sem vontade própria. Ronaldo então percebeu seu grande equívoco: Contraditoriamente, combatera e aniquilara na moça exatamente aquilo que despertara nele a paixão arrebatadora por ela. E a paixão fora embora no momento que Lanie, antes altiva e independente, começara a agir como uma súdita que tudo acata e obedece.

E, enquanto Lanie planejava toda uma vida em comum para ambos, Ronaldo só pensava em uma maneira de tornar o fim menos doloroso. Mas a coragem de Ronaldo, bicho-homem viril e volúvel, não o acompanhava quando o assunto era sentimento. E ele adiou o tempo que pode o fim, que em seu ser já restara decidido.
Algum tempo depois, o rapaz, enfadado por não conseguir uma maneira mais nobre para se desvencilhar do compromisso, começou a mudar de comportamento. Tornou-se ranzinza, reclamão, mal-humorado. Talvez uma estratégia inconsciente para que Lanie decidisse por ele dar fim aquele moribundo relacionamento.

Lanie, teimosamente apaixonada, tentava sem sucesso mudar aquela situação. Tentativas vãs: Ronaldo cada dia se fechava mais e mais. Lanie, por não conseguir enxergar as incongruências do seu amado, começou a culpa-se pelo desconforto que sentia na relação. E se culpando, Lanie sem saber, transformava-se mais e mais no ser subserviente e concessivo que exterminara a paixão de Ronaldo.
Um dia Ronaldo, inundado de admirável coragem, de supetão disse a velha e batida frase: 'Não dá mais!'. E pediu para que Laine saísse de seu apartamento. Laine não queria acreditar. Perdeu o chão. Entre lágrimas ponderou, negociou, jurou que mudaria o que estivesse errado caso ele lhe desse uma chance, apenas mais uma.

Contudo a cena, longe de comover ou reativar a paixão adormecida de Ronaldo, irritava-o profundamente, causando-lhe uma vontade urgente de correr, ir para o mais longe possível de Lanie. Na verdade, Ronaldo estava cansado. Cansado do amor incondicional de Lanie, que tudo cedia e nada exigia.

E enquanto Ronaldo fugia súbito e apressado do apartamento, fechando a porta atrás de si, Lanie, num lapso de tempo e sem pestanejar, atirou-se da sacada da sala do apartamento. E ambos fugiram da morte do amor.

quinta-feira, 8 de maio de 2008


Um blog é apenas um blog, apenas um blog...


Naquele tempo chamava-se diário. Um caderninho que toda adolescente tinha. Lá a gente escrevia todos os pequenos segredos inconfessáveis aos pais. O primeiro amor, o primeiro encontro, o primeiro beijo, a primeira mão boba e suas inconfessáveis sensações, misto de medo e vontade urgente.
Lá também, naquele caderninho que ficava tão bem escondido embaixo do colchão (o único lugar que a xereta da sua mãe não o encontraria), eram registradas as grandes desilusões que permeiam a vida de qualquer garota: A decepção causada pela melhor amiga, aquela para quem você daria até o seu melhor jeans, e que se mostrou uma tremenda 'fura-olho'; A briga com seus pais e a vontade de ir embora, por os pés na estrada e descobrir o mundo; O medo de se tornar apenas mais um arremedo de mulher, submissa, casta e triste, como pareciam ser tantas outras mais que você conhecia; Também era lá que ficavam registrados todos os mutáveis sonhos juvenis, fruto de uma mente que sequer teve tempo de aprender a trilhar o próprio caminho; As decepções na escola; O amor que se perdeu por questões insignificantes...
Naquele tempo ter um diário era possuir uma Caixa de Pandora da qual só você tinha a senha para desvendá-la. O diário de uma adolescente era algo ultra-secreto, que você defenderia a intocabilidade com a própria vida. Sim, porque toda adolescente, de todos os tempos (idos e vindos) é intensa até às pontas das unhas. Para elas, tudo se resume a trágica questão de vida ou morte. Meninas não titubeiam em fazer até mesmo greve de fome, e chegam a definhar, ao saberem terem sidos violados os seus segredos (conheço uma doce menina que fez isso).

Mas enfim, éramos tão mais felizes ao resguardar da curiosidade alheia nossas pequenas e insignificantes inconfidências juvenis...


O diário, da forma que a nossa geração conheceu, perdeu-se no tempo. Cedeu seu espaço aos blogs. Curiosamente, não são os adolescentes que os maiores clientes de mais essa ferramenta virtual. Somos nós, a trintona geração coca-cola (ou seria agora geração coca light?).

A meninada não parece ter tanto entusiasmo assim para escrever nessa geringonça virtual. Poucos se arremessam nesse rapel 'Aureliano', aventura mais radical impossível. E se o fazem, utilizam o bizarro e, por vezes, excludente código teen da net, vulgo '
internetês'. E nós, seres primitivos dos anos 80, adoradores da infalível caneta BIC e das cadernetas Faber Castell , gastamos horas à tentar adivinhar o que significa 'OMG', código comumente escrito no diário virtual daquelas estranhas criaturas espinhentas.


Mas, enfim, continuando.

A idéia de construir mais um blog (já tive outros mais que foram, vergonhosamente, abandonados, esquecidos no meio do caminho) atraiu-me inicialmente. Em contrapartida, também gerou em mim um pouco de hesitação. Afinal, minhas idéias nunca foram as mais palatáveis e sociáveis possíveis. Estaria eu contribuindo para aumentar minha legião de desafetos, expondo particularidade de uma
'mente geniosa'(para quem não percebeu, isso é uma ironia)em um instrumento democrático, porquanto sua possibilidade de discondância, como é o blog? É um ponto.


Para além disso, ainda existem outros pontos mais inconvenientes :


Eu, tal como meu amigo designer gráfico (desculpa ai amigo![:d]) e jornalista/escritor desde o nascimento* - Denuxo Caxumba-, sinto-me irritada "com a natureza mono lógica dos blogs".

Sabe aquela sensação péssima que te assola à boca do estômago quando tu lês algo escrito por alguém queridíssimo, algo que tu não concordas, que até mesmo te irrita profundamente, porém, não te sentes confortável para escrever o próprio ponto-de-vista? E quando resolves escrever, se resolves, estais sempre acompanhado do senhor 'ponderação' e da dona 'omissão', que te limam e te calam sempre que tentas ser mais incisivo? 'Pois intão', como diria o Ivanzitos. Isso tudo torna os blogs alheios similares às aulas de professor autoritário. Aquele mestre que não te deixa interromper sua explanação, nem mesmo para esclarecer uma importante dúvida sua, e só te concede o poder da palavra se esta for para reafirmar a incontestável sapiência do todo poderoso.

Há também outro ponto que me incomoda um pouco mais: Não seria o blog pessoal, mais uma entre tantas tentativas dessa nossa triste geração midiática de conseguir seus quinze minutos de fama? Afinal, todos queremos ser ouvidos, lidos e reconhecidos em nossas qualidades. Ou não? Dúvidas, dúvidas e mais dúvidas, como diria aquele meu outro amiguinho...

Apesar de todos esses potenciais empecilhos psicológicos, resolvi construir minha página de vomitação de asneiras verbais. Como tudo mais na vida, esta não é para ser levada sempre à sério. Há que se manter o espaço para o sarcasmo, as piadinhas de duplo sentido, a ironia, e a inexperiência em se tratando de determinados assuntos. Erro que assola 10 entre 10
palpiteiros de plantão. E eu não poderia passar incólume a mais esse pecado.

Meu diário de capa cor de rosa, agora neste blog se vê ressuscitado, com letrinhas mais coloridas e sem a necessidade de usar cola Polar para enfeitá-lo com ridículas, mas imprescindíveis florzinhas e dezenas de coraçõeszinhos. Não é mais um espaço para inconfidências inconfessáveis. É apenas uma ferramenta de leiga palpitação que desejo dividir com os amigos que fiz pela vida afora, no mundo real e também no mundo virtual.

Não esperem demais desse papagaio que existe apenas como possibilidade, explicitação de meu complexo interior de balzaca com eterna alma de adolescente revolucionária. Não esperem nada além de um brinquedinho virtual escrito por alguém falível e irremediavelmente humano (Valha-me Santo Nietzsche!). Portanto, repleto de equívocos e certezas vãs.

Meça-o com olhos de crítico voraz, se assim lhe aprouver. Ou com a assertividade daqueles que preferem o carinho, à retórica maniqueísta. Mas leia-o, acima de tudo, como se fosse um fórum de discussão, tal qual os que freqüentamos nos sites de relacionamentos.
Quero saber sua opinião, seu ponto-de-vista, ter seu feedback. Não é isso que nos distingue dos primitivos? O diálogo? Perceba que o título desse treco não foi escolhido aleatoriamente: Miragens Teylúricas. Nada aqui será mais que isso: Uma sombra vista pelos olhos míopes da autora, de dentro da sua caverna ilusionista. Fantasmas. Miragens. E não haveria de ser diferente, afinal esse troço não pretensiona ser nada além de apenas um blog, apenas um blog...





Em tempo: 'OMG' no código teen da net significa "Oh My God!"[:o].
Valha-me Nossa Senhora das Assimilações Ortográficas![:d]

* Denuxo, para às favas com a obrigatoriedade da titulação, não compactuo com mais essa farsa capitalista, forma contemporânea de exclusão, forjada pela elite e jamais contestada pela intelectualidade permissiva. Forma impositiva que aparta aqueles que possuem dons naturais, primando pelos profissionais direcionados, catequizados e condicionados nas salas acadêmicas.
E tenho dito!(falei bonito, heim!) kkkkkkk